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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2013 Katrina Williams

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

Os passos do romance, n.º 1202 - Julho 2014

Título original: The Things She Says

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises

Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5344-7

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo Um

Capítulo Dois

Capítulo Três

Capítulo Quatro

Capítulo Cinco

Capítulo Seis

Capítulo Sete

Capítulo Oito

Capítulo Nove

Epílogo

Volta

Capítulo Um

 

A única coisa pior do que estar perdido era estar perdido no Texas. No mês de agosto.

Kris Demetrious inclinou-se para trás no assento do Ferrari amarelo emprestado. Não tinha GPS. A paisagem estava rodeada de montanhas por todos os lados mas, ao contrário de Los Angeles, em nenhuma delas havia mansões ou placares como o de Hollywood, nem nenhum ponto de referência que indicasse se ia na direção correta.

Ele nunca se perdia nos estúdios de filmagem. Se lhe dessem uma cena para filmar e esta não corresse bem, para começar de novo bastaria gritar: corta!

O que é que lhe passara pela cabeça para ir a Dallas de carro em vez de ir de avião?

Uma tática dilatória.

Morrer no deserto não estava na sua lista de coisas para fazer, mas evitar o seu destino estava. Preferia continuar perdido porque assim que chegasse a Dallas teria que anunciar o seu noivado com a namoradinha da América, Kyla Monroe.

Kris guardou o telemóvel no bolso, semicerrando os olhos para evitar o sol impiedoso. Como estava vestido de preto, era ainda mais insuportável. O calor transformava o horizonte num borrão... mas, naquele preciso momento, pareceu-lhe ver uma nuvem de pó ao longe. Segundos depois, uma carrinha cor de laranja apareceu no meio da nuvem e parou na área de descanso, atrás do Ferrari.

Kris fechou os olhos para evitar a areia que os enormes pneus levantavam e, afastando o cabelo do rosto, foi cumprimentar o seu salvador.

Se tivesse ficado sem gasolina, poderia ter ficado ali durante dias, a lutar contra os abutres, porque estava totalmente perdido. O condutor da carrinha chegara na melhor altura e, com um pouco de sorte, poderia indicar-lhe como voltar à autoestrada.

A porta da carrinha abriu-se e o sol iluminou o letreiro: «Oficina Big Bobby, desde 1956».

Kris viu umas botas cheias de pó sobre as quais emergia uma pequena figura. Uma rapariga. Uma rapariga muito jovem.

– Algum problema, chefe? – saudou-o.

O seu sotaque do Texas era tão profundo como a nuvem de pó, mas tinha uma voz musical. E quando tirou os óculos de sol, o mundo pareceu parar por um instante.

O calor, a falta de sinalização e os problemas que o esperavam em Dallas desapareceram ao ver uns olhos azuis-claros num rosto oval, emoldurado por uma massa de caracóis cor de canela sobre uma face de porcelana. Um rosto pouco vulgar, sem sombra de maquilhagem, que merecia um segundo olhar. E um terceiro. Nem sequer precisaria de a iluminar para obter um bom plano. Era fresca, inocente e absolutamente bela. Como um girassol. Gostaria de filmá-la...

Kris fechou a boca e pigarreou.

– Um ou outro, sim.

– És sul-americano?

– Grego.

Kris não costumava ser tão seco. Sentia-se tão americano que esquecera por completo as suas raízes gregas. Por que motivo dissera aquilo? E como é que uma pessoa tão pequena podia provocar-lhe um curto-circuito no cérebro em menos de trinta segundos?

– Ah, com sotaque sexy e tudo. Diz-me outra coisa – continuou ela. – Diz-me que a tua vida não faz sentido sem mim e que darias uma fortuna para ires para a cama comigo.

Kris olhou para ela, boquiaberto.

– A sério?

Ela riu-se, um som puro que pareceu tocá-lo por dentro. Tinha uma graça especial que irradiava como um perfume.

Exibia uma segurança que contrastava com a sua aparência adolescente. Devia ter vinte e poucos anos. E de onde é que uma rapariga, oriunda de uma terra de ninguém, ia desencantar uma confiança daquelas? Tinha a sensação de que mais depressa seria o novo Charles Manson do que o novo Scorsese.

– Não vemos muitos estrangeiros por aqui... e não me importo de dar uma olhadela. Bom, quero dizer, dar uma olhadela ao carro.

Ao carro? Então devia ser mecânica na oficina Big Bobby. Interessante. A maioria das mulheres que ele conhecia nem sequer sabia onde fica o depósito da gasolina.

– O carro não tem problema nenhum, eu é que me perdi – esclareceu ele, enquanto a sua imaginação se perdia na expressão «dar uma olhadela».

As mulheres faziam-lhe propostas constantemente, mas sem qualquer subtileza, que era algo de que não gostava e que costumava recusar. Não tinha interesse em relações sentimentais a não ser que fossem ficção ou a forma como queria levar uma história ao grande ecrã.

Mas aquela mulher conseguira tirá-lo de trás da câmara com meia dúzia de frases. Era surpreendente.

Tudo o que lhe saía da boca era uma insinuação velada e isso, combinado com um rosto tão fresco e um sorriso tão fabuloso, era uma novidade.

Kris aproximou-se um pouco mais, o suficiente para lhe sentir o cheiro do cabelo. Cheirava a coco e a óleo de motor, uma combinação que não deveria excitá-lo, de todo. Tal como a t-shirt larga com o logótipo da universidade católica do Texas e as calças de ganga velhas que, nela, pareciam peças de alta costura.

Chamou-a com o dedo e ela deu um passo em frente.

– Neste momento, só quero uma coisa de ti – disse-lhe.

– O que é que queres? – a jovem humedeceu os lábios com a ponta da língua e Kris teve que engolir em seco.

O que começara como um divertido namorico começava a entrar num terreno perigoso. Kris ansiava por beijar aquela miragem do deserto, provar aqueles lábios rosados.

Beijar estranhas não era minimamente o seu estilo o que, naquele momento, ele lamentava.

– Que me digas onde estou.

– Ah, estás perdido? – ela olhou-o de cima a baixo. – Então, é uma sorte que eu te tenha encontrado. Estás na estrada de Little Crooked Creek, também conhecida como o meio de nenhures. Antes havia um ribeiro por aqui...

– Um ribeiro no meio deste deserto?

Água fria, um lugar perfeito para nadarem nus...

Não, nada de estranhas nuas. O que é que se estava a passar com ele?

– Não – a jovem franziu o nariz de uma forma encantadora. – Secou no século passado e ninguém teve imaginação suficiente para mudar o nome à localidade ou à estrada.

– E está sempre assim tanto calor?

Na realidade, deixara de o incomodar a camisa encharcada em suor. A necessidade de continuar ali com ela era imperiosa.

– Não, na verdade não. Normalmente está mais calor. Por isso é que aqui ninguém se veste de preto – respondeu ela, com um olhar mais ardente do que o asfalto. – Embora a ti te fique bem. O que é que fazes tão longe da autoestrada?

– Oxalá a história fosse mais interessante do que ter feito uma curva errada, mas não é – Kris sorriu, talvez porque já não lamentava assim tanto o engano. – Apanhei a saída de El Paso pensando que ia na direção correta para Dallas, mas aqui estou eu.

– Perdido nesta estrada a sul de Rio Grande, onde não há rio e muito menos grande. Não é o que eu recomendaria como destino de férias, por isso deverias voltar a Van Horn e apanhar a dez na direção este.

– Van Horn. Lembro-me vagamente de ter passado por lá.

– Não há muito para lembrar. A vila não mudou nos últimos anos. Bom, tenho que me ir embora. O pneu sobressalente que levo ali não se vai mudar sozinho na carrinha do Gus – a jovem suspirou, apontando por cima do ombro. – Van Horn é por ali. Boa sorte e cuidado com a polícia de trânsito. Adoram multar carros desportivos.

– Está bem.

– Também poderias seguir em frente mais um par de quilómetros e tomar a primeira saída à direita. Por aí chegarás ao centro de Little Crooked Creek e ao melhor frango frito da região.

Kris continuava a desfrutar da harmonia da sua voz. Mesmo que demorasse um mês a chegar a Dallas, isso não alteraria o seu descontentamento com o acordo financeiro de Visões a negro. Kyla continuaria a ser Kyla: infiel, egoísta e artificial e ele teria que desperdiçar demasiada energia a tentar não lhe dar demasiada importância.

Mas, lembrou a si mesmo que valia a pena. Se o queria fazer, tinha que ganhar publicidade graças a um falso noivado com a ex-namorada, a atriz mais adorada pelas massas e vencedora de um Óscar.

– O frango frito é o meu prato preferido – disse-lhe. E estava cheio de fome. Que diferença fazia um pouco mais de atraso? Afinal de contas, fora de carro para Dallas de propósito. – Como é Little Crooked Creek?

– A vila mais triste que terás a infelicidade de visitar na tua vida – respondeu ela. – E é onde eu vivo.

 

 

O seu deus grego seguia-a. V. J. olhou pelo retrovisor. Sim, o Ferrari amarelo continuava atrás da carrinha. O acaso deixara cair uma fantasia em forma de homem no meio da estrada, num lugar onde nunca acontecia nada, e aquela maravilha de homem ia atrás dela.

Enlouquecida, aturdida. Era assim que se sentia. Esperara durante muito tempo por um cavaleiro andante de armadura brilhante, mas jamais teria imaginado que o iria encontrar no meio da estrada. E, no entanto, ali estava ele de carne e osso.

V. J. estacionou a carrinha em frente ao único restaurante da vila e franziu a testa ao ver uma carrinha branca. Lenny e Billy já estavam ali, pelo que devia ser mais tarde do que pensava. Os seus irmãos nunca se levantavam da cama antes das três e só mesmo sob ameaça de que se não se levantassem não teriam pequeno-almoço.

Com um pouco de sorte, ainda iriam na primeira caneca de café e não iriam reparar no estranho que entrava com ela no Pearl’s. A última coisa que queria era que aquele belíssimo estranho tivesse que levar com os dois rapazes mais tolos do Texas.

O Ferrari parou ao lado dela e o deus grego saiu dele com uma inata graciosidade masculina. Era o homem mais belo que alguma vez vira e era todo seu. Pelo menos para já.

Não tinha ilusões imaginando que um homem tão sofisticado pudesse ficar ali, mas não era nenhum crime desfrutar da sua beleza até que fosse à sua vida.

V. J. pegou na mochila e juntou-se a ele no passeio.

– Vamos?

– Claro.

O Pearl’s estava quase vazio. Ele parecia tão deslocado ali que, em segundos, todos os olhares estavam cravados nele enquanto iam para a mesa ao lado da cozinha, a que estava habitualmente reservada para casais. V. J. deixou-se cair no banco.

Kris sentou-se e juntou as mãos por cima da mesa de fórmica, com as iniciais LT&SR gravadas no centro.

Laurie e Steve eram casados há quase vinte anos. Eram um típico casal do campo e contrastavam bastante com aquele homem que, sem dúvida, frequentaria bares de sushi e elegantes clubes noturnos.

Como pudera pensar em levá-lo a almoçar ali?

– Um lugar interessante.

Velho, escuro e com cheiro a gordura rançosa, sim, mas «interessante» não era a melhor palavra para descrever o Pearl’s.

– A melhor cozinha num raio de muitos quilómetros. A única, na verdade.

Ele riu-se e V. J. procurou algo engraçado para dizer para ouvi-lo rir de novo. Mas abandonou a ideia quando cravou nela aqueles incríveis olhos cor de chocolate. Tinha um rosto que parecia ter sido esculpido em mármore.

– Chamo-me Kris – apresentou-se, estendendo-lhe a mão. – De Los Angeles.

V. J. limpou a mão nas calças de ganga antes de lha apertar e, de imediato, sentiu uma descarga elétrica.

– Lamento a eletricidade estática. Nesta época do ano acontece muito – murmurou, afastando a mão. Seria demasiado melodramático prometer não voltar a lavá-la? – Eu chamo-me V. J. Lewis e sou de lado nenhum. E continuarei a ser de lado nenhum se não começar a trabalhar agora mesmo. Estou a poupar tudo o que posso para fugir daqui.

Depois de dizer aquilo, levantou-se. Odiava fazê-lo, mas eram quase quatro horas.

– Vais embora? – Kris inclinou a cabeça e uma madeixa de cabelo, que lhe chegava quase aos ombros, caiu-lhe sobre a testa.

Ela pôs as mãos atrás das costas para não cair na tentação de tocar-lhe. Não se podia tocar nas obras de arte.

– Tenho que vestir a farda.

Kris olhou para os restantes clientes, que os observavam descaradamente.

– Trabalhas aqui?

O sotaque dele era espantoso. Falava a língua dela, a que usara toda a vida, mas cada sílaba parecia exótica e especial.

– Sim. Cinco dias por semana.

Pelo canto do olho viu que os irmãos se dirigiam à mesa.

– Quem é o otário? – perguntou Lenny.

V. J. deu-lhe um murro no ombro.

– Deixa-o em paz. Está aqui só de passagem, por isso não é uma ameaça.

Lenny empurrou-a para um lado, como se não pesasse mais do que uma pluma e, antes que conseguisse recuperar o equilíbrio, Kris levantou-se do banco para colocar-se ao lado dela, fulminando Lenny e Billy com o olhar. O seu coração acelerou quando ele se colocou à sua frente como um escudo. Ninguém em Little Crooked Creek se atrevia a enfrentar um dos irmãos dela e muito menos os dois ao mesmo tempo. Kris era um herói.

– Kristian Demetrious – apresentou-se. – E tu? – perguntou-lhe bruscamente. Ela não precisava de mais nada para assumir que ele era o cavaleiro andante que estava ali para a salvar.

Mas, então, registou o nome dele: Kristian Demetrious...

V. J. pestanejou rapidamente. Kristian Demetrious, o famoso realizador de cinema?

Ninguém iria acreditar. Parecia totalmente diferente ao vivo. Certamente pensava que era uma idiota por não o ter reconhecido antes. Tinha que ligar a Pamela Sue de imediato. Depois de confirmar que Lenny e Billy não varriam o chão com o noivo de Kyla Monroe, claro.

– São os meus irmãos. Gostam de armar-se em duros, mas são inofensivos – disse-lhe. – Desculpa-os, é que fecharam os manicómios da zona – acrescentou, empurrando-os. – Vá, vão tomar outro café. Pago eu. E acalmem-se um pouco, o senhor Demetrious não veio cá para discutir convosco.

Kristian Demetrious, o noivo de Kyla Monroe. Os homens como ele estavam sempre noivos de mulheres como Kyla: lindíssima, elegante e famosa, com uma estante cheia de prémios.

Bom, soubera desde o início que aquele deus não estava ao seu alcance. Interpretara mal os seus inocentes comentários, retorcendo-os para transformá-los em algo saído de uma novela romântica.

Lenny e Billy afastaram-se para o bar, olhando por cima do ombro.

– São um pouco idiotas, lamento. Mas, de qualquer forma, obrigada por tentares salvar-me.

Kris encolheu os ombros, afastando o cabelo do rosto com uma expressão incomodada.

– Agora chamas-me senhor Demetrious? – brincou, voltando a sentar-se. – Não gosto de formalidades. Podemos voltar a ser Kris e V. J.?

O sorriso dele era tão contagioso, tão surpreendente, que V. J. retribuiu-lho sem se aperceber.

– Não, não podemos. A minha mãe educou-me para que fosse respeitadora.

– Gosto mais quando não o és – Kris deixou escapar um suspiro. – Evidentemente, sabes quem sou. Imagino que seja pela Kyla, não por teres visto os meus filmes.

– Lamento. Leio a revista People, mas se estiverem dois filmes em cartaz em Van Horn já é uma sorte. Para este canto perdido do mundo, os teus filmes são demasiado... não sei, sofisticados.

– Obscuros – disse ele, com uma expressão decidida, apaixonada. – Mas isso vai mudar e muito em breve.

– Ah, muito bem. Bom, eu tenho que trabalhar.

Tinha que se afastar antes que começasse a interrogá-lo sobre o seu trabalho, planos, sonhos. Gostaria de ouvi-lo falar toda a noite, uma conversa sofisticada, daquelas que nunca podia ter com ninguém em Little Crooked Creek.

Mas quando se ia virar, Kris segurou-lhe no braço e o calor da mão dele fê-la suspirar.

Como seria maravilhoso ter aquela mão, as duas, sobre o seu corpo, acariciando-a, despindo-a...

– Muda de roupa depressa, estou a morrer de fome – disse ele, arqueando uma sobrancelha.

Antes de saber que estava noivo, aquele era o tipo de comentário que teria confundido com um convite.

– O cliente é que manda. Volto já.

V. J. afastou-se, temendo que desaparecesse se virasse a cabeça para olhar para ele.

Pertenciam a mundos diferentes, pensou. Ele estava ali só por acidente, não para tornar os sonhos dela realidade.

Kris Demetrious era um homem comprometido que aterrara no meio de Little Crooked Creek por algumas horas, mas que em breve desapareceria da sua vida.