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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2009 Claire Baxter

© 2016 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Voltar a emocionar-se, n.º 1250 - Junho 2016

Título original: Her Mediterranean Makeover

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em português em 2010

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Bianca e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin

Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-8315-4

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Epílogo

Se gostou deste livro…

Capítulo 1

 

Era tão agradável ouvir a voz da sua filha… Leonie segurou o auscultador do telefone contra o ouvido e perguntou-se em que estivera a pensar quando se inscrevera num curso que ia ter lugar do outro lado do mundo.

Sim, efectivamente, os seus filhos já eram maiores de idade, mas, apesar de serem adultos, ainda precisavam dela. E ela também sentia necessidade deles. Nunca se tinham separado antes, pelo menos não durante tanto tempo. Na verdade, não muito mais do que durava um acampamento de Verão.

– Podias ter-me enviado uma mensagem, mãe. Não tinhas de voltar a telefonar-me.

– Só queria certificar-me de que sabes usar a máquina de lavar roupa. É um pouco complicado quando não se está habituado.

– Sim, mãe. As tuas instruções estavam muito bem explicadas – disse Sam. – Essa é a verdadeira razão da tua chamada, mãe?

– É claro! – exclamou Leonie, contraindo o rosto ao verificar que a sua filha a apanhara. Samantha sempre fora a mais sensível dos seus filhos. Mesmo quando era apenas um bebé, fora capaz de captar as mudanças no estado de espírito da sua mãe. – Bom, para ser sincera, só queria saber se estavas bem, querida.

– Sim, mãe. Claro que estou bem. Não tens de te preocupar.

– E o teu irmão?

– Kyle também está bem. Quer dizer, continua tão irritante como sempre, mas penso que sobreviveremos até regressares a casa. Afinal de contas, são apenas algumas semanas. Este é o teu momento, mãe. Mereces isto. Diverte-te.

– Não é uma questão de algumas semanas, mas de três meses!

– Garanto-te que passará a voar – disse Sam, rindo-se. – Tu dizias-me sempre isso quando tinha de voltar para a escola depois das férias do Verão, lembras-te?

Claro que Leonie se lembrava. Oxalá pudesse recuperar esses momentos. Enquanto se despedia da sua filha, teve de conter as lágrimas. Então, dirigiu-se para a porta do terraço do seu pequeno apartamento. Não se via muito de Nice. Apenas os edifícios da rua estreita. Aquilo era culpa dela por ter decidido ficar na parte antiga da cidade. Rejeitara a ideia de viver na residência da academia de línguas, que era nos subúrbios de Nice, e decidira arrendar o seu próprio apartamento mobilado. Pensara que assim seria muito mais fácil visitar a cidade. No entanto, naquele momento, não sabia se a sua escolha fora a correcta.

O apartamento era muito mais pequeno do que lhe parecera na Internet. Pensara que teria um ar pitoresco e era assim, mas para alguém que estava habituada a uma casa familiar espaçosa no meio de uma parcela generosa, aquele apartamento, com a sua cozinha americana num canto e uma pequena casa de banho era bastante chocante. Como também era o costume de secar a roupa lavada na rua. Leonie não gostava muito da ideia de pendurar a sua roupa interior numa corda para que todos pudessem inspeccioná-la.

Havia vezes, como aquela, em que o apartamento lhe causava uma certa sensação de claustrofobia, coisa que ela nunca sentira em toda a sua vida. Por sorte, pelo menos tinha uma varanda.

Como sempre, uma senhora idosa e bela estava sentada na varanda à frente da dela. Estava sempre muito bem penteada e arranjada. Leonie perguntou-se porque que o fazia se nunca saía. Estaria à espera de alguém que nunca chegaria?

Tentara sorrir e cumprimentá-la, mas nunca obtivera reacção alguma. Voltou a tentar.

Bonjour, madame

Como resposta, recebeu um frio assentimento de cabeça. Começava a melhorar.

Leonie olhou para a rua e perguntou-se o que podia fazer para passar o tempo. Decidiu não ir visitar a cidade. Não era que não o desejasse, mas não lhe apetecia fazê-lo sozinha. Tentara explorar a cidade, mas, mesmo com a ajuda de um guia, não parava de se perder. O seu sentido de orientação nunca fora muito bom, ainda que, na verdade, nunca tivesse tido de o usar. Durante as viagens familiares, ela só tivera de se certificar de que todos os membros da família tinham comida e bebida suficientes, que punham creme protector e que se divertiam muito.

No entanto, o seu papel mudara. Além disso, o problema era que quando, finalmente encontrava um lugar para onde queria ir, não tinha ninguém com quem o partilhar.

Sem marido e sem filhos. Durante muito tempo, eles tinham sido toda a sua vida. Era deprimente estar sozinha.

Para além de sentir desesperadamente a falta dos seus filhos, Leonie não sabia se acertara aos inscrever-se naquele curso de línguas. Sempre quisera melhorar o seu nível de francês e sempre quisera viajar. No entanto, casara-se com Shane ao sair do liceu e ajudara-o a criar o seu negócio. Depois, tinham tido os seus filhos e ela criara-os sozinha durante a longa doença do seu marido, e não conseguira fazer nenhuma das duas coisas.

Por isso, três anos depois da morte de Shane, com os seus dois filhos na universidade, finalmente estava disposta a descobrir por si própria o amplo mundo que a esperava e tudo o que tinha para oferecer. Além disso, também tinha dinheiro para poder fazê-lo. Entre o seguro de vida de Shane e a venda do negócio de canalização, Leonie podia ter uma vida muito confortável. Nunca precisaria de trabalhar.

Aprender francês em França… Parecera-lhe o plano perfeito, mas não estava a ser como ela esperara. Em primeiro lugar, era muito difícil aprender o francês ou talvez ela já fosse demasiado velha para tentar.

Para o caso de isso ser pouco, havia mais uma coisa. Pensara que conseguiria fazer novos amigos no seu curso, mas não contara com o facto de o resto dos alunos ser tão jovem. Eram bastante simpáticos, mas quando lhe perguntavam se ela queria sair para tomar uma bebida, Leonie apercebia-se que só o faziam por cortesia. Portanto, não ia. De todos os modos, não gostava. Seria como sair com os amigos dos seus filhos e isso não lhe parecia bem.

Até ao momento, parecera-lhe que os franceses que conhecera eram muito corteses. Comportavam-se muito amavelmente quando ela entrava numa loja, o que era muito agradável, mas a conversa não ia mais além. Pelo menos, não conversavam com desconhecidos. Na sua curta experiência, os empregados não falavam a menos que falassem com eles primeiro e, então, só o faziam contrariados.

À excepção do homem que geria um pequeno café que encontrara na semana anterior. Leonie estivera a percorrer as ruas estreitas da velha Nice quando uma porta se abrira junto dela. O cheiro a café que saíra do interior do local, combinado com o som de vozes alegres, fora suficiente para a fazer querer entrar.

Ao olhar por cima da porta, viu que não havia cartaz algum. Apenas alguns vasos com flores alegres no parapeito de uma janela. No entanto, o cheiro a café e as pequenas mesas que havia no seu interior atraíram-na imediatamente. No interior do pequeno estabelecimento, as boas-vindas que recebera tinham-na animado tanto como o café.

Jean-Claude, o empregado que a atendera, mostrara-se amistoso e com vontade de falar. Interessara-se por ela. Isso teria sido razão suficiente para a fazer querer regressar lá, mas também gostara do ambiente, da música de jazz e da decoração artística do local.

Os clientes tinham acesso a todos os jornais franceses, que Leonie gostara de folhear, examinando os poucos artigos que ela era quase capaz de compreender. Se ficasse, o seu objectivo seria compreender mais francês escrito todos os dias.

Poucos minutos depois, saiu do apartamento e dirigiu-se para o pequeno café. Podia sair para comprar ela os jornais, mas aquilo era muito mais agradável. Dava-lhe a ilusão de que estava a começar a encaixar. Além disso, assim tinha alguma coisa para fazer e era precisamente disso que precisava. Durante todos os anos que passara a cuidar dos outros, sonhara desfrutar a sós de umas férias, de ter tempo para não fazer nada. No entanto, exactamente quando cumprira o seu desejo, não sabia se gostava. Talvez simplesmente se tivesse habituado a que precisassem dela e, ali, ninguém precisava dela. A sensação era muito estranha.

O café estava muito cheio e Jean-Claude não tinha tempo para conversar. Quando se dirigiu para a zona das revistas, só lá estavam os jornais mais difíceis, bom pelo menos para ela. Pegou num deles e dirigiu-se para uma mesa. Compreender uma palavra de cada vinte não fazia com que a leitura fosse muito entretida.

Depois de pôr o jornal em cima da mesa, bebeu um gole de café e examinou a sala. Perguntou-se se aquela seria a regra e se a primeira vez que visitara o café fora num dia em que havia poucos clientes. Enquanto ia examinando as mesas, obrigou-se a reparar novamente numa delas. Um homem muito bonito estava a sorrir para ela. Leonie olhou para trás dela e viu que não havia mais ninguém. Deus, estava a sorrir para ela.

Retribuiu o sorriso. Vira-o antes. No primeiro dia em que entrara naquele café, ele estava sentado ao balcão. Reparara nele. Parecera-lhe que ele se destacava de todos os outros, com a sua camisa branca imaculada e umas calças escuras quando a maioria dos outros clientes vestia roupa mais informal. Decidiu que, provavelmente, trabalhava perto dali. No entanto, havia muito mais do que a sua aparência, algo mais que o fazia destacar-se… A sua presença. Carisma.

Fosse o que fosse, ele estava ali, a observá-la. Talvez achasse que a conhecia de algum lado. Se fosse assim, estava muito enganado. Encolheu mentalmente os ombros, deixou o seu café, tirou os seus óculos de leitura e tentou concentrar-se nas palavras que tinha à frente dela.

Quando estava a meio do artigo, viu-se interrompida por uma voz masculina. Quando olhou por cima dos óculos, concentrou o olhar no homem que estava à frente dela. Era o que estivera a sorrir antes. O mesmo homem em que ela reparara. E era muito mais bonito de perto.

Era mais maduro do que lhe parecera ao princípio. Tinha cabelos brancos suficientes para o fazer parecer… de confiança. O mesmo acontecia com as linhas de expressão que tinha à volta dos olhos castanhos, uns olhos repletos de carinho e sentido de humor, tanto que ela não conseguiu reprimir um sorriso, apesar de não saber o que o homem acabara de lhe dizer.

Rapidamente, pôs os óculos na parte de cima da cabeça, onde ficaram ancorados pelo seu cabelo encaracolado. Então, pediu-lhe que lhe repetisse o que acabara de lhe dizer. Observou cuidadosamente a boca do homem enquanto falava, fazendo o possível para separar os sons para formar palavras individuais sem muita sorte.

Abanou a cabeça e encolheu os ombros. A compaixão reflectiu-se no rosto do desconhecido. Inclinou-se para a frente.

Vous êtes sourde? – perguntou-lhe, com muita clareza.

«Sourde, sourde…». Leonie tentou recordar o significado daquela palavra.

O desconhecido cobriu os ouvidos com as mãos e acompanhou a acção levantando as sobrancelhas a modo de interrogação.

Surda! Era o que queria perguntar.

– Não, não – disse ela, abanando a cabeça. – Sou da Austrália.

– Lamento – respondeu ele, trocando para o inglês rapidamente. – Não me tinha parecido. Este café normalmente não atrai os turistas.

– Não me surpreende. Eu encontrei-o por puro acaso. Não há nada no exterior que indique que é um café.

– Não. Nós gostamos assim – comentou ele, com um sorriso. – Lamento. Não queria ofendê-la.

– Não me ofendi. Eu não sou turista.

Ah, bon? Vive aqui?

– Bom, temporariamente. Vim estudar a língua, por isso sou estudante. Sei que pareço demasiado velha para isso. Tem alguma coisa contra estudantes? – perguntou-lhe. Tinha a certeza de que alguém com uns olhos que reflectiam sentido de humor não podia falar a sério quando dissera que tinha antipatia por um grupo concreto de pessoas.

– Claro que não. E também não tenho nada contra turistas – declarou. – São muito importantes para a economia. Criam muitos postos de trabalho, como poderia ter alguma coisa contra? – perguntou. Então, apontou para a cadeira que Leonie tinha à sua frente. – Posso sentar-me?

– Sim, por favor.

– Estive na Austrália e também na Nova Zelândia.

– Oh, então, está a ganhar-me. Eu não estive na Nova Zelândia. Na verdade, nunca tinha saído do meu país até vir aqui. Viaja muito?

– Agora não. Tenho compromissos que fazem com que viajar seja muito difícil, mas, quando era jovem, queria ver o mundo inteiro e, para o conseguir, viajava do modo mais barato possível.

– Ah… Com uma mochila às costas?

– Alojava-me em albergues com pessoas que conhecia. Suponho que sim, que podíamos dizer que andei com a mochila às costas. Assim aprendi inglês, porque era essencial. Para poder fazê-lo, fui à vindima e fiz todo o tipo de trabalhos temporários.

Leonie apostava que tivera muito sucesso entre as raparigas. Embora o seu inglês fosse perfeito, falava-o com um ligeiro sotaque inconfundivelmente francês. Na sua juventude, devia ter sido muito bonito. A combinação devia ter sido letal.

– Está sozinha?

– Sim – respondeu ela. Durante um instante, perguntou-se se fizera bem em admiti-lo. Apesar de ser um desconhecido, não lhe parecia perigoso. Além disso, ele não sabia onde Leonie se alojava. Não havia risco algum.

Ele pareceu reparar nas dúvidas de Leonie, porque se apressou a falar.

– Não queria abusar.

– Não, não… Não está a intrometer-se.

– Da última vez, reparei que preferia este jornal – disse, dando-lhe a publicação que ele tinha nas mãos. – Não é tão pesado como esse que está a ler. Agora, deixo-a com a sua leitura.

– Oh, está bem… – sussurrou ela. – O meu nome é Leonie – acrescentou rapidamente, para que a conversa não acabasse tão depressa. – Talvez voltemos a ver-nos.

Ele sorriu e Leonie experimentou uma sensação muito pouco familiar de… apreço. Não era atracção. Simplesmente, não via um homem tão bonito há muito tempo. Se é que alguma vez vira. Aquele sorriso devia vir com um aviso prévio. Se ela fosse outra pessoa, alguém mais novo, alguém… Bom, o que fosse, teria caído de costas. Mas ela era esposa e mãe. Ou melhor, fora esposa e continuava a ser mãe. Estava acima de tudo isso.

Além disso, estava sentada.

– Espero que sim. Venho aqui com frequência.

Ele continuava a ser um desconhecido. Na verdade, acabara de lhe sugerir que voltassem a encontrar-se quando não sabia nada dele? O que estava a fazer?

Ele estendeu a mão.

– O meu nome é Jacques Broussard. Sou um velho amigo do dono deste local – disse, apontando para Jean-Claude. – As nossas famílias conhecem-se há muitos anos. Digo-o para o caso de querer saber a quem pode perguntar para saber se sou de confiança.

– Leu-me o pensamento?

– Não posso dizer que ler o pensamento seja um dos meus talentos – comentou ele, com um sorriso, – mas parece-me uma mulher sensata e qualquer mulher sensata devia ter cuidado ao falar com desconhecidos.

– Sim, bom… O meu nome é Leonie Winters. É um prazer conhecê-lo. E obrigada por isto – disse, apontando para o jornal. – Com o outro estava a ter alguns problemas.

– É compreensível. De nada.

Quando ele se foi embora, Leonie permaneceu sentada. Jacques Broussard. Que rico nome. Muito… Hum… Francês. Ainda sentia o toque da sua mão, como se tivesse deixado rasto. Olhou para ela, mas abanou imediatamente a cabeça. A ideia era ridícula.

A última vez que alguém lhe apertara a mão fora no enterro de Shane. Antes de conseguir impedi-lo, as lembranças daquele dia apoderaram-se dela, afastando todos os outros pensamentos. Muitos dos seus antigos empregados tinham-se aproximado para lhe apertar a mão, para lhe apresentarem os seus pêsames. Sentiu uma tristeza profunda ao reviver aquele momento. Todos tinham admirado muito Shane, principalmente pela sua ética de trabalho e pelo seu compromisso total com tudo o que fazia.

Shane estivera totalmente comprometido com ela. Não fora uma mulher sortuda?

Não só conseguira casar-se com o seu namorado do liceu, como também tinham permanecido apaixonados ao longo de vinte anos de casamento. Não havia muitos casais que pudessem dizer o mesmo.

A sua união vira-se abençoada com a chegada de dois filhos maravilhosos que nunca lhes tinham causado o sofrimento que ela vira noutras famílias. A sua unidade familiar sempre estivera muito unida e fora muito feliz. Shane levara a sua família muito a sério, assim como a sua carreira e a sua saúde. Por isso, era injusto que, apesar de todos os seus cuidados, não tivesse conseguido evitar ficar doente.

Ela fizera o possível para conseguir que melhorasse e, quando fora evidente que Shane não ia recuperar, fizera o que estava ao seu alcance para que ele fosse feliz ou que, pelo menos, estivesse confortável. Esforçara-se muito e ele agradecera. Shane nunca se queixara de nada. Agradecera-lhe todos os dias pelos sacrifícios que ela fazia.

Para Leonie, nada fora mais importante do que poder passar todo o tempo possível com Shane, cuidando dele pessoalmente. Não se importara com tudo o que perdera.

O que é que Shane pensaria dela naquele momento? Abandonara os seus filhos com o objectivo frívolo de aprender outra língua. De que lhe serviria isso?

Quando voltasse para casa, provavelmente nunca mais voltaria a visitar a França. Então, o que estava a fazer ali? A perder tempo e dinheiro? Ou estivera à procura de alguma coisa? Da sua própria vida?

A pouco e pouco, os seus olhos tinham-se enchido de lágrimas, que começaram a cair sobre o jornal que Jacques lhe emprestara.

Tinha de se controlar. Já tinham passado três anos desde a morte de Shane e, na maior parte do tempo, estava bem. As lembranças só se tornavam difíceis em algumas ocasiões. Tinha muita sorte. Quantas mulheres podiam fazer exactamente o que sempre tinham querido fazer?

Limpou as lágrimas antes de mancharem ainda mais o jornal e recordou uma coisa que Jacques lhe dissera. Ele reparara no jornal que ela escolhera na semana anterior. Estivera a observá-la. Não sabia se devia sentir-se lisonjeada ou preocupada.

Talvez devesse fazer o que lhe sugerira e fazer algumas perguntas para saber mais sobre ele. Abanou a cabeça. Não era necessário. O simples facto de ele o ter sugerido era suficiente para indicar que Jacques não tinha nada para esconder. Além disso, o que estavam a fazer para além de falar? Mais nada. Não se tratava de um encontro.

Jacques era observador. Isso não tinha nada de mal. Provavelmente, reparava em pequenos detalhes de todos os clientes do café. Não lhe faria mal fazer o mesmo. Estivera muito tempo a viver num mundo demasiado pequeno.